Já sou professor há duas décadas e durante esse período de tempo todo(a)s o(a)s aluno(a)s me marcaram. Contudo, hoje, vou escrever sobre uma aluna em particular. Vou falar-vos da Sofia e vou falar-vos de mim próprio. A Sofia foi uma menina extraordinária, tal como são todos os meus alunos! Enquanto mantivemos uma relação professor-aluna mais próxima, entre 2003 e 2005, tive a honra de ver uma menina entrar todas as semanas no laboratório de Biologia da Escola Secundária de Estarreja. Impressionava pela sua educação, simpatia e alegria contagiantes. Não me recordo desta menina alguma vez ter feito um queixume ou uma cena de vitimização, como é comum nas nossas salas de aula. Queria aprender! Queria praticar! Os seus olhos brilhavam com cada no desafio proposto, com cada nova actividade a desenvolver e sorria, sorria muito! Mesmo que o professor não sorrisse, mesmo que o/as colegas não sorrissem, a Sofia inundava-nos de alegria.
Plantas ou animais, microscópios ou lupas, campo ou laboratório eram uma satisfação para a Sofia.
Há uns meses atrás, soube que esta menina estava com um grave problema de saúde. Procurei todas as fotos e filmes que pudesse ter registado do seu trabalho nas minhas aulas. Não encontrei nada, à excepção de desenhos por ela efectuados em aulas laboratoriais. Eu acredito na não-localidade quântica e acredito na força da intenção no auxílio de pessoas doentes. Achei muito estranho, porque sabia ter registos de praticamente todos os alunos da turma dela. Na altura questionei-me: "Como posso ter-me esquecido da Sofia?"...
Há relativamente pouco tempo, uma amiga dela, deu-me a notícia... A Sofia tinha morrido. Pediu-me, então, que lhe enviasse as fotos que tivesse da amiga e do seu trabalho nas aulas. Mais uma vez, procurei esses registos e encontrei-os. Há coisas que me deixam atónito. Efectuei a mesma procura, utilizando os mesmo critérios de busca nas centenas de ficheiros que guardo das minhas aulas e, finalmente, encontrei as fotos da Sofia... Sempre os tive e não era para os encontrar enquanto estivesse doente.
A Sofia teve um papel muito importante a cumprir nesta existência física. Ela materializava toda a alegria de uma turma e dos respectivos professores. A isto chamo uma projecção colectiva: se não somos capazes, enquanto colectivo, de expressar alegria, simpatia e outros sentimentos de luz, vamos metê-los no saco ou projectá-los num indivíduo que não tenha medo de expressá-los. A Sofia funcionou, assim, como uma projecção da sombra de luz de muitas pessoas. Esta glória ninguém lha tira! Ela mostrou-nos o que está em nós! As almas nobres são assim. São de uma sabedoria de tal forma ampla que, a um nível mais profundo, escolhem curtas existências nesta realidade (i)material e as pessoas com as quais terão de interactuar. Não importa o que queiramos fazer com elas. Não importa que queiramos curá-las, protegê-las ou ensiná-las. Nunca são verdadeiramente "aprendizes", são verdadeiramente livres, já sabem quase tudo, não precisam de estar aqui muito tempo. A arrogância é completamente aceite por uma alma nobre, como tal, é devolvida de forma determinada. Uma alma nobre não precisa de ser curada, porque nos mostra os caminhos da cura. Nós temos muito a aprender com elas. É preciso estarmos despertos e conscientes para o que elas nos têm para dizer. Depois de desaparecerem, só há três formas de mostrar o amor que sentimos por elas e por nós mesmos: sorrindo, sentindo-nos gratos por terem passado pelas nossas vidas e deixando-as partir.
Obrigado Sofi! Até sempre!